NOSSA CHEGADA – O que fazer em Bordeaux

A viagem seria curta, cerca de três horas. Estávamos saindo de Toulouse com destino à região de Bordeaux para começar nossa imersão pelas regiões vinícolas da França. No som do carro colocamos Edith Piaf cantando La Vie en Rose: “C’est toi pour moi / Moi pour toi / Dans la vie”. Clima de romance no ar. Estávamos a caminho de realizar um grande sonho, dos maiores dentro desta viagem que durou cinco meses e que passou por onze países europeus. Ao longo da estrada víamos surgindo as primeiras parreiras, o solo pedregoso, o sol brilhava e o termômetro marcava 34 graus.
De repente, um carro da polícia apareceu na nossa frente no meio da estrada com uma placa acesa no vidro de trás onde estava escrito: “Suivez moi”. Não sabemos falar francês, mas entendemos que era para seguir o veículo. Fernando me pediu para pegar toda a documentação enquanto fazia a manobra para o acostamento. Desci do carro e tentei explicar com tranquilidade que éramos turistas e que não falávamos o idioma. O policial, então, resolveu fazer mímica: dobrou as pernas e fez um movimento com as mãos pra baixo e pra cima, dando a entender que estávamos indo muito devagar. E nos sentenciou: para ir nesta velocidade, vá pela direita. À droite.
Ele foi embora e eu não conseguia parar de rir. Um misto de alívio do nervoso somado à sensação ridícula de sermos parados por estarmos dirigindo muito devagar. Seguimos. Pela direita, claro, afinal a gente queria mesmo desacelerar. Pressa e Bordeaux não combinam.

ROTEIRO COMPLETO DE TRÊS DIAS
Dia 1 – CENTRO DE BORDEAUX
No primeiro dia, sugerimos ir direto passear no centro de Bordeaux. Conhecida como a nova Paris, a cidade encanta por seus monumentos históricos restaurados, metade da capital do vinho virou Patrimônio Universal pela Unesco, com mais de 350 edifícios tombados.

Nós deixamos o nosso carro em um dos estacionamentos subterrâneos que ficam na avenida principal, a Quai Louis XVIII, à beira do rio Garonne. De lá fomos caminhando para o Centro de Informação ao Turista para buscar saber sobre as visitas às vinícolas. Na recepção nos perguntaram em qual idioma preferíamos ser atendidos (e eles possuem funcionários que falam português), nos entregaram mapas, nos deram um livro com informações e contatos de todas as vinícolas de Bordeaux, nos indicaram as vinícolas que estariam abertas para visita sem necessidade de reserva e nos venderam os tickets de um passeio de trenzinho elétrico para conhecer a cidade. Saímos de lá com uma inveja danada. Imagine se o Brasil recebesse seus turistas com a mesma eficiência?
Em frente ao Centro de Informação ao Turista você vai ver o famoso Bar a Vin, administrado pelo CIVB (Conseil Interprofessionnel du Vin de Bordeaux). Lá você pode aproveitar para fazer algumas boas degustações. Mas se viajar no verão, como nós, provavelmente terá de enfrentar uma fila de espera. Nós acabamos desistindo já que no dia seguinte iríamos visitar as vinícolas.

O passeio de trem elétrico se iniciou ali perto, em frente ao Carrossel Palace 1900 (Allées de Tourny) e durou 45 minutos. Passamos pela Praça de Quinconces e o monumento aos Girondinos (grupo político da época da Revolução Francesa), pela Igreja Notre-Dame, entre outros pontos. Ao longo do passeio fomos escutando a narração em um áudio gravado (não há disponibilidade em português, nós escolhemos em inglês). O ticket custa 10 euros por pessoa.
Quer conhecer outra região vinícola da França? Veja nosso post sobre Chateauneuf-du-Pape.


Outra boa forma de conhecer a cidade é caminhando, já que as principais ruas do centro foram transformadas em calçadões para pedestres. Aproveite para conhecer o maior espelho d’água do mundo, que no verão fica lotado de crianças e adultos se refrescando e brincando. Ele faz parte do Patrimônio Mundial Contemporâneo. São dois centímetros de água que depois se transformam em vapor, gerando um efeito de neblina que cobre as pessoas. É lindo!

Quando for chegando a hora do jantar, não faltarão boas opções para te deixar com água na boca, mas saiba que se você quiser um restaurante mais arrumadinho, é importante fazer reserva. Já passamos alguns momentos de bastante irritação na França vendo mesas vazias e não conseguindo sentar por falta de reserva. Indicamos fazê-las pelo aplicativo The Fork.

Nossa dica para este primeiro dia é o restaurante Le Bordeaux, que fica em frente à Ópera Nacional de Bordeaux. Ele é indicado do Guia Michelin na categoria Bom Conforto e sua história teve início lá em 1850, quando era conhecido como “Café de Bordeaux”. Foi ali que Victor Hugo fez um de seus famosos discursos sobre a união da Europa e foi também onde o pintor Toulouse Lautrec pintou um dos garçons para criar o Retrato de Antoine (Antoine´s Portrait). A decoração ainda mantém um estilo Belle Époque. Para saber mais informações sobre o cardápio e fazer sua reserva, clique aqui.



DIA 2 – OS VINHEDOS – O que fazer em Bordeaux
Bordeaux é um oásis do vinho, possui 5.800 viticultores e 111.400 hectares de uvas plantadas. A produção é gigantesca, de lá são vendidas 20 garrafas por segundo ao redor do mundo. Por isso, é natural que você fique um pouco perdido na hora de escolher qual vinícola visitar. O guia impresso que pegamos no Centro de Informações ao Turista nos ajudou muito. Você pode ver um guia online oficial aqui, assim já vai se organizando para fazer as reservas.

UM POUCO DE HISTÓRIA – A CLASSIFICAÇÃO DE 1855
Os vinhos de Bordeaux são famosos no mundo todo há séculos. Mas o sucesso maior se deu depois de 1855, quando Napoleão III encomendou à Câmara de Comércio de Bordeaux que fizesse uma classificação dos vinhos. A Câmara, então, passou a missão ao Sindicato de Negociantes e estes produziram, em duas semanas, uma lista com 57 vinhos divididos em cinco categorias (ao longo do tempo houve modificações e hoje a lista conta com 61 nomes).

Os premiers Crus, analisados como os melhores, são cinco: Château Lafite, Château Latour, Château Margaux, Château Haut-Brion e Château Mouton Rothschild (promovido em 1973). Algumas dessas vinícolas recebem pouquíssimos turistas (só com reserva) e a degustação é privilégio de convidados ilustres. Não é o caso do Château Mouton Rothschild. Fomos passear por lá apenas para ver o prédio e descobrimos que havia disponibilidade para um tour naquela mesma tarde. Mas o preço é bem mais salgado que o de outras vinícolas da região: 50 euros por pessoa (com direito a uma degustação). Vale lembrar que este já foi considerado o vinho mais caro do mundo quando uma garrafa de Mouton Rothschild 1945 foi vendida por 310 mil dólares em 2007 (valor superado pelo Romanne-Conti 1945, da Borgonha, leiloado por 558 mil dólares em 2018).


Nós preferimos marcar um tour privado em uma vinícola Deuxième Cru: o Château Pichon Longueville Baron, hoje de propriedade de uma empresa multinacional de seguros, a AXA. Se quiser saber mais sobre esta vinícola, leia o artigo da Revista Adega. Nós adoramos a visita! O castelo, construído por Raoul de Pichon Longueville em 1851 é inspirado em um dos castelos mais famosos do Vale do Loire, o Azay-le-Rideau. O passeio mostrou uma vinícola extremamente tecnológica e cuidadosa com sua produção. Para finalizar, provamos alguns rótulos, entre eles, o principal, Pichon Baron, safra 2015. O tour privado custou 20 euros por pessoa. Para entrar em contato com a vinícola e fazer sua reserva, clique aqui.

Que tal fazer um curso de culinária italiana na Toscana? Nós fizemos e contamos tudo aqui!
ALMOÇO NA REGIÃO DE PAUILLAC
A vinícola Pichon Longueville Baron fica na região de Pauillac, considerada uma das mais nobres áreas vinícolas da França. Ali estão três dos cinco Première Crus de Bordeaux: Lafite, Mouton Rothschild e Latour. Depois de nossa visita, resolvemos buscar um restaurante próximo para almoçar e descobrimos o ótimo Saint Julien, que fica a menos de 2 km da vinícola. A comida estava sensacional, pedi uma galinha d´angola e Fernando foi de cordeiro. A única ressalva que fazemos é que a varanda estava super quente e eles não abriram o salão interno, que é climatizado. Mas já percebemos que esta é uma característica dos franceses, eles adoram comer nas varandas para aproveitar o verão.

Alcachofra com grapefruit


VINÍCOLAS ABERTAS PARA VISITAÇÃO SEM RESERVA
Como dissemos no início do texto, algumas vinícolas ficam abertas para visitação sem necessidade de reserva antecipada. No Centro de Atendimento ao Turista você consegue a lista com os dias, horários e endereços de cada uma delas. Nós aproveitamos para conhecer o Château Marquis de Terme (4eme cru classé), que fica na região de Margaux e demos sorte. Como não havia nenhum outro turista interessado no tour em inglês, nós “ganhamos” um tour privado e pudemos aproveitar para fazer perguntas que iam além do processo utilizado na vinícola. O passeio custou 10 euros por pessoa com direito a degustação de alguns rótulos.
Veja também:


DIA 3 – SAINT-ÉMILION – O que fazer em Bordeaux
A estrada entre Bordeaux e Saint-Émilion é linda. São cerca de 50 quilômetros por ruas tranquilas rodeadas de parreiras por todos os lados, além dos famosos châteaux – os castelos dentro das vinícolas, que nos deixam encantados. No caminho um deles nos chamou tanto a atenção que resolvemos estacionar para saber do que se tratava.

O Château Grand Barrail é uma propriedade que possui uma vinícola, um hotel e um restaurante que estava aberto e tinha vaga para almoçar sem necessidade de reserva. Definitivamente, foi nosso dia de sorte. Sentamos em uma mesa perfeita, com uma vista maravilhosa e pudemos experimentar um cardápio sensacional. Com certeza foi melhor do que enfrentar uma multidão de turistas lutando por uma mesa nos restaurantes que ficam dentro de Saint-Emilion.


Quando chegamos na cidade medieval, estacionamos o carro do lado de fora, sempre lembrando de fazer o pagamento nas máquinas para não ter nenhum problema com multas ou reboques, e entramos na cidade. Logo na chegada você também poderá pedir ajuda no Centro de Informações ao Turista. Ali, além de pegar os mapas, você compra os ingressos para as atrações. A pequena e mágica Saint-Emilion encanta logo de cara. A cidade, tombada como patrimônio pela Unesco, tem programas de apoio de restauração e de conservação dos edifícios, alguns deles com séculos de história.
Um pouco de história e um pouco de lenda

A igreja monolítica (construída em uma pedra só) foi esculpida em rocha calcária embaixo da terra no início do século 12. No passeio para conhecê-la, que dura cerca de 45 minutos, passamos pela caverna de Saint Emilion, a pequena Capela Trinity com suas pinturas medievais intactas, as Catacumbas e finalmente a famosa igreja escavada na pedra.



Também aprendemos um pouco sobre a história da cidade. Ela foi fundada no século 8 por um homem proveniente da região da Bretanha que era conhecido por fazer milagres e que resolveu encontrar um lugar para se aposentar e se dedicar a orações. Com a companhia de alguns beneditinos ele criou a primeira comunidade religiosa e evangelizou a população. Quando passamos pela caverna onde o santo Emilion supostamente fazia suas orações, a guia disse que existe uma crença de que a construção é sagrada e que mulheres com problemas para engravidar sentam ali e são curadas. Ela afirmou que a cidade de Saint-Emilion recebe visitantes do mundo todo com este propósito. O passeio custa 9 euros por pessoa e você pode comprar com antecedência pelo site oficial clicando aqui.
Conhecendo a cidade – O que fazer em Saint-Émilion

Outro passeio que fizemos foi o de Tuc Tuc. Você pode escolher aprender sobre a história de Saint-Émilion ou sobre as vinícolas. O tour dura cerca de 50 minutos e custa 12 euros por pessoa.
Os vinhos de Saint-Émilion
Apesar de ser uma cidade próxima de Bordeaux, Saint-Émilion produz vinhos bem diferentes. A começar pela uva, a que reina na margem esquerda do rio é a Merlot, com importante presença da Cabernet Franc. Como são uvas menos encorpadas que a Cabernet Sauvignon, são vinhos que normalmente amadurecem mais cedo. A classificação também é distinta e sofre alterações ao longo do tempo. Apenas em 1955 Saint-Emilion começou a classificar seus vinhos, ordem que seria revista em 1969, 1986, 1996, e 2006. São considerados os melhores vinhos da região os Prèmier Cru Classe A, que atualmente são: Château Angélus, Château Ausone, Château Cheval Blanc e Château Pavie. Para saber mais, veja esta matéria da revista Adega.

Essas foram as nossas dicas para sua viagem. Qualquer dúvida deixe o seu comentário ou entre em contato conosco. Boa viagem!